“Debaixo dos Arcos” foi, e ainda é, o primeiro blogue não virtual de Aveiro. Espaço de encontro, “tertúlia” espontânea, “diz-que-disse”, fofoquice pegada, críticas e louvores, ..., é uma zona nobre da cidade, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontram e conversam sobre "tudo e nada": o centro do mundo...

13 dezembro 2007

Entre mortos e feridos...

Publicado na edição de hoje (13.12.07) do Diário de Aveiro.

Crónicas dos Arcos
STOP. Há guerra no asfalto!


Os números valem o que valem. Mas não deixam, igualmente, de valer pela capacidade de reproduzirem realidades.
Hoje, as estradas de Portugal, num ano, matam mais que a Guerra do Iraque provoca baixas militares no contingente americano.
Começa a parecer perigoso sair de casa, seja a pé, de transporte individual ou colectivo.
Está em curso, desde o passado dia 25 de Novembro, mais uma acção de fiscalização reforçada da GNR - Operação Viagem Segura, que terminará a 7 de Janeiro de 2008. Como já se tornou um hábito estas acções fiscalizadoras nas principais quadras festivas: Natal - Final do Ano - Carnaval - Pascoa e Verão.
Pena é que estes períodos não sejam simultaneamente aproveitados para uma reflexão concertada, apresentação de soluções sustentáveis e implementação de medidas concretas e racionais (para além de transversais) que minimizem este trauma rodoviário em que mergulhámos.
É que o flagelo da sinistralidade rodoviária tornou-se um problema seriamente grave e relevante. Contrariando a tendência para a desaceleração estatística, os dados mais recentes demonstram que o processo retomou a curva ascendente: em 2007 registaram-se, entre Janeiro e Novembro, 802 mortes, mais 40 do que em igual período de 2006 (fonte: Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária - ANSR.
Só nos primeiros quinze dias da operação “Viagem Segura”, a GNR contabilizou já 24 vítimas mortais nas estradas portuguesas.
As causas, mais que conhecidas, em vez de gerarem decisões e resultados preventivos, servem para desculpabilizar responsabilidades e transferi-las para terceiros.
O governo entende que a ausência de civismo, a falta de cultura rodoviária e a incúria dos automobilistas, é a responsável pelo estado caótico da sinistralidade. Sendo, no entanto, legítimo reconhecer que os portugueses têm um comportamento ao volante de uma irresponsabilidade atroz.
Os cidadãos acham que a responsabilidade é governativa, quer no que respeita ao estado lastimável do património viário, pelos erros cometidos no seu planeamento, construção e manutenção, quer pela fragilidade e debilidade do quadro legislativo, cível e criminal.
Acresce ainda, o “sacudir o capote” para as entidades fiscalizadoras (GNR - PSP - ex-DGV, Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária e Ministério da Administração Interna) e a sua inoperacionalidade efectiva, bem como a deficiência da sinalização existente.
Aliás, Portugal é exemplar na evidência em como não é possível serem tomadas medidas concertadas, transversais aos diversos sectores da sociedade.
A responsabilidade é impessoal. A culpa morreu sempre solteira.
Só com muito esforço e vontade de todos os intervenientes (públicos, privados e associativos) neste processo, será possível reflectir, determinar causas, projectar soluções e implementar medidas concretas que tornem seguro viajar pelos caminhos, pelas ruas, estradas, IP’s e auto-estradas deste país.
Esta é uma realidade que deveria ser encarada como uma prioridade nacional, quer pela dimensão do problema, pela sua implicação no desenvolvimento cultural e social do país, mas também pela sua transversalidade, tocando vários sectores da sociedade: ensino - saúde - segurança social - emprego - economia - ambiente. E deveria ser enfrentada com ambição, mesmo que desmedida.
Não parece ser consequente enquadrar os objectivos do combate à sinistralidade rodoviária com uma meta tão simplicista, como a afirmação do Ministro da Administração Interna, em Novembro passado, por ocasião da celebração do Dia Mundial das Memórias das Vítimas das Estradas (18 de Novembro): “número de mortes nas estradas inferiores a 1000 por ano”.
É triste que a vida humana seja encarada como um mero dado estatístico. Esquecendo, o Sr. Ministro, que tal valor significa, em média, cerca de 3 vidas perdidas por dia.
E nem que fosse apenas uma. Porque, constitucionalmente, dentro dos princípios universais e moralmente, a vida humana (uma única que seja) é inviolável.
Boas e seguras viagens.

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