“Debaixo dos Arcos” foi, e ainda é, o primeiro blogue não virtual de Aveiro. Espaço de encontro, “tertúlia” espontânea, “diz-que-disse”, fofoquice pegada, críticas e louvores, ..., é uma zona nobre da cidade, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontram e conversam sobre "tudo e nada": o centro do mundo...

01 fevereiro 2008

O Tal Canal

Publicado na edição de ontem (31.01.2008) do Diário de Aveiro.

Crónicas dos Arcos
O “Tal Canal”.

No final do ano de 2007 e já durante este mês de Janeiro, por diversas vezes e distintas ocasiões, foi-se discutindo, embora de uma forma muito superficial ou em círculos muito restritos, o projecto do governo de criar (por concurso público) um novo canal de televisão generalista, em regime aberto (não pago para o utilizador). Isto é… mais um canal de televisão.
Nos dias de hoje, é indiscutível a dimensão da actual “sociedade da informação”, que muitos atribuem já a denominação de “sociedade da comunicação” (por forçado peso das novas tecnologias nesse processo comunicacional).
Não deixa de ser um facto irrefutável de que a Comunicação Social tem um papel privilegiado e fundamental (para não dizer o ou um dos mais importantes) na socialização das comunidades, no seu desenvolvimento e estruturação, bem como na promoção do conhecimento.
Não seria possível concebermos o conceito de sociedade e de vivência comunitária, se não existisse o processo comunicacional.
Daí que a responsabilidade seja acrescida no desempenho deste papel socializador das comunidades. E quanto mais esta sociedade evolui, se transforma, se estrutura, se dinamiza, mais fulcral é o papel da comunicação social nessa socialização das comunidades e no desempenho da sua função de consciência social.
Assim, na sociedade actual o público forma a sua própria opinião, as suas convicções, a sua realidade social em função da informação que recolhe dos meios de comunicação social de massas.
Competindo directamente e em muitos casos sobrepondo-se claramente à acção social da escola, da família, da religião, os meios de comunicação têm uma capacidade intrínseca de dinamizar alternativas e movimentações sociais capazes de provocar alterações nas estruturas individuais e colectivas da sociedade, ao nível social, económico, político, cultural e até mesmo histórico.
Veja-se o recente caso da demissão do Ministro da Saúde e a contestação às políticas implementadas ou a implementar nesta ara social tão sensível (mesmo que a mudança ministerial dificilmente vá alterar o processo).
Assim, pode-se clarificar e simplificar o papel dos media na sociedade com duas vertentes: a de “vigiar” (controlando as acções governativas nacionais ou locais e das estruturas do estado e da sociedade) e a de “educar” (permitindo espaços de discussão, partilha e assimilação, através da informação e das mensagens divulgadas).
Mas estas duas “imagens” do papel de socialização dos media são, muitas vezes e com forte relevo, invadidas por um “ruído” que limita e influencia igualmente a actividade dos meios de comunicação. O peso que os grupos económicos e políticos exercem sobre o emissor tem regulado a sua forma de actuar e transmitir a mensagem, alterando e condicionando igualmente os seus efeitos junto do indivíduo, do grupo ou da estrutura social.
Daí que, infelizmente, o debate se tenha centrado penas na questão economicista que a concorrência de um novo canal provocará nos três (ou quatro) já existentes. Mas esta é a lógica do mercado. Reduzir a questão apenas à sobrevivência (de qualquer modo importante e significativa) económica é extremamente redutora para uma temática mais abrangente.
E o público?! E a oferta da programação?! E a qualidade informativa?!
E esta é que me parece ser a questão fundamental.
Num país da dimensão como a nossa, com o nível de aculturação e a iliteracia existentes, a existência de mais um canal de televisão reflectirá uma maior socialização dos indivíduos e das comunidades?
Conseguirá, de facto, ser alternativa à qualidade (boa ou má) existente?! Ou, pelo contrário, significará maior quantidade de “lixo” informativo?!
Portugal não tem um sector social, cultural e político capaz de gerar quantidade informativa que justifique o acréscimo de mais um espaço televisivo (compare-se, por exemplo, ao que acontece no sector da imprensa escrita). Como dizia um professor de comunicação do ISCIA, "aumenta a oferta dos órgãos de comunicação, mas aumenta igualmente a informação deficiente, incoerente, sem rigor ou qualidade".
Este é o verdadeiro problema: a quantidade raramente é sinónimo de qualidade.
Assim progride a nação. Assim cresce a sociedade.

2 comentários:

saltapocinhas disse...

e o artigo é teu?
é um assunto em que nunca pensei, não me aquece nem me arrefece!

Migas (miguel araújo) disse...

SaltaPocinhas
Todas as quintas feiras, num Diário de Aveiro perto de si, as Crónicas dos Arcos tem a assinatura deste modesto aveirense e gema.