Preia-Mar
O Vídeo e o Contra-vídeo!
Um dos direitos fundamentais (seja natural ou constitucional) é o da liberdade de expressão. Algo que, por formação, muito prezo. Assim, entendo que todo e qualquer cidadão tem o direito ao seu sentido crítico e ao pleno exercício da sua cidadania.
Vem este contexto a propósito de um vídeo lançado pela JS de Aveiro como repto ao vídeo promocional do projecto LifeCycle, apresentado pela autarquia aveirense, em Sevilha, e, ainda, no seguimento do que aqui escrevi na semana passada “A opção somo nós!”.
Primeiro, importa uma declaração de interesses. Não assumo qualquer posição oficial da autarquia, nem tão pouco faria qualquer sentido, comento apenas como cidadão e pelo facto de ter estado cerca de ano e meio envolvido directamente na equipa coordenadora do projecto Life Cycle em Aveiro.
Segunda nota… Não tenho qualquer intenção de refutar ou rejeitar a posição política e crítica da JS de Aveiro, pelas razões já apontadas. Apenas um mero comentário e uma clarificação de alguns aspectos que merecem algum cuidado, e que possam contribuir para a discussão do tema.
O primeiro aspecto a realçar tem a ver com o objectivo do projecto e do vídeo em causa. O LifeCycle é um projecto europeu de mobilidade saudável, ao qual a autarquia aveirense se candidatou (a custo zero), cujo objectivo é a promoção do uso da bicicleta (e não a BUGA, ou não apenas a BUGA) no quotidiano dos cidadãos, muito para além da vertente do lazer. Trata-se um programa de mobilidade, definido e estruturado no âmbito da Comunidade Europeia, que associa a utilização da bicicleta como modo suave de transporte nas deslocações do dia-a-dia (emprego, escola, tarefas diárias) com benefícios para a saúde (nomeadamente, obesidade e doenças cardiovasculares) e para o bem-estar. E este objectivo assenta, não em estruturas físicas, mas tão somente no promoção, sensibilização, alteração de hábitos e cultura de mobilidade.
Em segundo lugar, quer o projecto, quer o vídeo não têm qualquer referência a ciclovias pelo facto do objectivo ser o de colocar a bicicleta no seu “habitat” natural de mobilidade que é a convivência com o automóvel (e não a sua segregação). Muitos são os conceitos e estudos de mobilidade e de acessibilidades que não defendem as ciclovias (excepção para volumes de tráfego intenso e velocidades de circulação elevadas), antes pelo contrário, defendem que um aumento significativo de bicicletas na via pública pode permitir uma redução da velocidade de circulação automóvel nos espaços urbanos e uma maior percepção da segurança. Por isso é que o vídeo do LifeCycle pretende demonstrar que a bicicleta é uma alternativa eficaz na mobilidade urbana (a imagem da “paixão”, da alternativa ao automóvel, mesmo em casos de “aflição”).
Há, por este motivo, um aspecto no vídeo promovido pela Juventude Socialista que merece uma especial referência (para além da questão política, que não vou discutir, inerente à ciclovia apresentada como exemplo e que é da responsabilidade da gestão autárquica socialista).
É que a maioria dos exemplos apresentados no vídeo da JS de Aveiro não são, nem devem corresponder, ao ambiente natural de circulação ciclável (nomeadamente os passeios).
Durante o decorrer do projecto, foram desenvolvidas várias campanhas, com vários públicos-alvo (escolas secundárias, universidade, universo laboral), em ambientes tão distintos como o espaço urbano (cidade) ou zonas mais rurais, mas com grande incidência de tráfego, como é o caso da estrada nacional que liga Azurva a Eixo ou a própria cidade.
De facto, o projecto pode concluir que Aveiro (Concelho), na sua globalidade, tem apetências muito favoráveis para o uso da bicicleta e em segurança (dois anos de campanha comprovaram essa realidade: muitas centenas de aderentes, sem qualquer tipo de acidente registado).
E como o disse na semana passada, a noção de insegurança ciclável em Aveiro é mais ilusória do que real. Não há registo de acidentes com os inúmeros estrangeiros (nomeadamente espanhóis) que utilizam a BUGA para visitar Aveiro.
O que o vídeo LifeCyle pretendeu, tão simplesmente, foi devolver à cidade a sua cultura ciclável, tão visível nos primeiros anos de existência, por exemplo, da Universidade de Aveiro (ainda hoje um dos maiores pólos de utilizadores da bicicleta no quotidiano citadino).
Se há muitas coisas que podem ser melhoradas em Aveiro para facilitar o uso da bicicleta, é indiscutível (muito para além das BUGA). Mas também cabe aos aveirenses assumir essa cultura de mobilidade e adoptar a bicicleta como um meio suave de transporte, e, principalmente, sem a mistificação de que andar de bicicleta destrói o “status”.
(nota: pelo contraditório - Video Aveiro LifeCycle - Video JS Aveiro
Sem comentários:
Enviar um comentário