“Debaixo dos Arcos” foi, e ainda é, o primeiro blogue não virtual de Aveiro. Espaço de encontro, “tertúlia” espontânea, “diz-que-disse”, fofoquice pegada, críticas e louvores, ..., é uma zona nobre da cidade, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontram e conversam sobre "tudo e nada": o centro do mundo...

29 janeiro 2012

A semana em Resumo... (21 a 27.01.2012)


Publicado na edição de hoje, 29.01.2012, do Diário de Aveiro

Entre a Proa e a Ré
A semana em resumo…


1. Sejam quais forem as medidas, as políticas, as ideologias que exerçam a responsabilidade de gestão do país, sejam quais foram as vozes de indignados, de insatisfeitos, de injustiçados, será sempre através da austeridade, dos sacrifícios, das medidas penalizadoras e restritivas que, em alturas de crise, o país poderá (e convém sublinhar “poderá”) sobreviver e ultrapassar a conjuntura. Para que a realidade fosse outra, os portugueses (os principais responsáveis pela realidade) teriam de alterar significativa e radicalmente a sua mentalidade e identidade: a subsidiodependência, a falta de rigor e o desenrasca, a deficiente responsabilidade de cidadania, o “chico-espertismo”, o desrespeito pelas regras e estruturas, a “cunha”, o “tachismo”, a burocracia, a “sociedade paralela”, o facilitismo, a “burlice”, a corrupção e o favoritismo, o “quem vier atrás que feche a porta”. Assim, de um assentada, com o risco da listagem pecar por defeito. É antiga a expressão “anda meio mundo a enganar outro tanto”: fuga às responsabilidades fiscais, despesismo, economia paralela, deficiente sentido da coisa e valor públicos, falta de urbanidade e sentido de bairro, desleixo pelo sentido de cidadania e das suas responsabilidades (direitos e deveres).
Tome-se como exemplo (já que a realidade é muito mais extensa que esta referência) uma das notícias de abertura desta semana: após ser obrigatória a indicação, em sede de IRS, dos números de identificação ficais dos dependentes, Portugal “perdeu”, em 2010, cerca de 111.400. Não por qualquer calamidade, por doença ou aumento da taxa de mortalidade… mas porque, no cruzamento de dados ficais, verificou-se que durante anos a fio houve a inscrição, por desconhecimento ou premeditação, de um elevado número dependentes que não o eram ou não existiam sequer. Paga o justo e o pecador.

2. Numa altura em que o calendário do processo da Reforma da Administração Local está a chegar ao seu limite, o governo, por via da “chantagem política”, pressiona as autarquias a fazerem por iniciativa própria o que não conseguiu fazer estruturalmente e por medida regulamentar. Apoiar a fusão de municípios concedendo-lhes mais 15% de transferência de verbas do Estado, em prejuízo do corte do mesmo valor nas autarquias que se mantenham “individualizadas”. É transferir a responsabilidade política para as autarquias e criar uma “guerra” entre pares.
E numa altura em que são conhecidos dados alarmantes sobre a saúde financeira municipal do país: das 308 câmaras municipais 38 têm problemas estruturais nas suas economias e são responsáveis por 30% da dívida superior a 90 dias que ascende a oito mil milhões de euros. Esta situação tem um impacto significativo no estrangulamento da economia local, já por si débil, com escala e sustentabilidade diminutas. De constatar ainda que do total deste valor, três mil milhões são dívida de longo prazo, o que acaba por ter peso na situação da banca.
Convém ressalvar que destes valores são excluídos os investimentos directos do Estado nos municípios, por exemplo, através do QREN.
Aliás, esta realidade tão pouco perceptível ao comum dos cidadãos é tão grave e preocupante que levou a que a Associação Nacional dos Municípios Portugueses tenha solicitado ao Governo um tratamento financeiro semelhante à ajuda que oi esta semana assinada para colmatar o “buraco” das contas orçamentais da Madeira.
No entanto, importa referir que, um dos aspectos importantes na gestão dos recursos públicos, nomeadamente os impostos e taxas cobrados aos cidadãos, se proceda com um maior rigor e transparências, seja a nível local, regional ou nacional.

3. Por último, a semana ficaria ainda marcada pelo “regresso” às páginas dos jornais e aos écrans das televisões de uma realidade social bem triste e preocupante: “este país não é, definitivamente, para velhos”. E não é porque os novos estejam a “cumprir” a sugestão governativa de emigrarem e procurarem além-fronteiras o que o país não lhes pode (e devia) oferecer.
É uma sociedade que se fecha cada vez mais, que perde, dia após dia, os valores da solidariedade, do respeito, da urbanidade, do sentido de bairro e de proximidade.
Cidadãos (sejam jovens ou adultos) que vivem cada vez mais isolados, indiferentes ao que e a quem os rodeia, à realidade social onde se inserem, ao seu vizinho.
As assimetrias que se vão agravando no país e nas regiões, o isolamento das localidades, a diminuição das acessibilidades (apesar do betão rodoviário), da mobilidade, dos serviços (saúde, transporte, educação, entre outros), e a falta de estruturas que valorizem o papel activo de todos, independentemente da sua condição e idade.
E a sociedade perdeu igualmente um dos valores mais importantes: o respeito e a valorização do saber, da experiência conquistada pelo percurso de vida, pelos anos, pelos “cabelos brancos”.
No espaço de cinco dias, um caso no Porto, as duas irmãs falecidas há mais de um mês em pleno centro de Lisboa, e, até mesmo, embora por circunstâncias distintas mas que não deixam de reflectir a forma como a sociedade lida com os seus cidadãos séniores, o caso do cidadão com 74 anos encontrado sem vida no parque de estacionamento do Hospital de Beja após ter deixado o serviço de urgência hospitalar.
Para não falar no abandono familiar dos idosos nas suas casas, em lares ou nos hospitais deste país.
Só tem valor quem produz, quem gere riqueza e paga impostos… este país não é para crianças, nem para velhos. Não o é para pessoas, mas tão só para números e orçamentos.
Uma boa semana.

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