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28 janeiro 2011

Resquícios eleitorais...

Publicado na edição de ontem (27.01.2011) do Diário de Aveiro.

Preia-Mar
Resquícios eleitorais...


Terminadas as eleições presidenciais de 2001 e contabilizados os votos, o que já seria de esperar (e por tradição) foi confirmado: Cavaco Silva ganhou à primeira volta (dados não definitivos à data da escrita 55%).
A vontade democrática (palavra tantas vezes proferida como propriedade apenas de alguns) ficou expressa, pelo menos, naqueles que sentiram a responsabilidade de exercer o seu direito de cidadania e também o dever cívico (infelizmente o número de abstenções foi, mais uma vez, demasiado elevado, mesmo com a agravante dos cartões de cidadão – acima dos 50%).
Do resultado eleitoral, mas essencialmente, da análise ao período da campanha há um dado inequívoco que importa realçar: é da responsabilidade exclusiva dos políticos o afastamento dos cidadãos em relação à política.
Isto porque a primeira avaliação que se pode fazer destas eleições presidenciais de 2011 é que se traduziram numa banalização de discursos, numa ausência do debate político, num total esvaziamento de convicções e posições.
É certo que as presidenciais não têm a mesma força eleitoral que as eleições legislativas, até pelo facto do Presidente da República não “governar”. Mas isso não pode implicar que o discurso político seja provido de combate ideológico, de apresentação de convicções pessoais sobre a sociedade, a economia, a própria política, as relações internacionais, e ideias concretas sobre a perspectiva futura do exercício da magistratura presidencial e do que significa, aos olhos dos comuns eleitores/cidadãos, ser Presidente de Portugal.
Isto ficou arredado dos palcos, dos holofotes, das câmaras, das linhas e linhas que foram sendo escritas.
Aliás, reveja-se a posição do candidato Defensor Moura que se apresentou à corrida a Belém com o único propósito de “combater” Cavaco Silva. Bem como o espelho abrasileirado da campanha de José Manuel Coelho a lembrar a recente campanha federal “Tiririca”. E sempre que alguém (mesmo a nível autárquico), como foi o caso de Fernando Nobre, se apresenta a sufrágio apenas com a legitimidade constitucional, a realidade torna-se madrasta já que Portugal (sociedade) não está preparado, nem estruturado, para candidaturas extra-partidárias oriundas da sociedade “civil”.
Restava por isso o confronto Cavaco Silva vs Manuel Alegre. E tal como há cinco anos atrás (em 2006), Cavaco Silva levou a melhor. Com a agravante de, nestas eleições, ter “esmagado” o seu opositor (Manuel Alegre com o apoio de dois aparelhos partidários não subiu o seu eleitorado em relação a 2006). E “esmagou” não só pela vontade dos cidadãos, pelo exercício do seu anterior mandato, pelo “cumprimento” da tradição que nos mostra que não há recandidaturas falhadas, mas sim porque Manuel Alegre foi um claro e notório erro de “casting” destas presidenciais ao ser apoiado expressamente pelo Partido Socialista e pelo Bloco de Esquerda.
Claramente preso num discurso politicamente correcto e amarrado às posições do Governo/PS e sem querer emergir muito nas convicções bloquistas (tirando o caso BPN) para não tomar partido da oposição, Manuel Alegre passou ao lado de questões importantes como o papel do Presidente da República Portuguesa, como o desempenho do cargo por parte de Cavaco Silva ou como a sua visão para os reais e concretos problemas do País que vão muito, mas mesmo muito, para além dos cantos dos Lusíadas e dum gasto discurso histórico estilo PREC que, passados 37 anos e com muitas alterações na sociedade, no mundo e na política, já nem para os que viveram Abril de 74 tem qualquer significado. E mesmo quando Manuel Alegre se insurgiu contra o facto de Cavaco Silva anunciar hipotética crise política, o candidato de Águeda esqueceu-se que, eventualmente, poderá ser esse o desejo de inúmeros portugueses.
Para além do facto de Manuel Alegre estar “colado” a um governo impopular, nas hostes socialistas o facto de somar o apoio do Bloco de Esquerda e as suas posições no Parlamento (acentuadas em 2006 aquando das anteriores presidenciais) angariou anticorpos e indiferença, para não dizer mesmo muitos desagradados. Aliás, para José Sócrates Manuel Alegre em Belém seria muito mais incómodo do que é Cavaco Silva.
E por mais que o Ministro da Defesa, Augusto Santos Silva, queira sacudir a “água do capote governamental” o que é certo é que estas eleições foram, igualmente, um claro sinal e cartão “vermelho” da sociedade às políticas, medidas de austeridade e a confusão governativa que tem pautado este segundo mandato socialista.
Aguarda-se um mandato mais incisivo e activo de Cavaco Silva… até que ponto Sócrates aguentará a pressão interna (nacional) e externa (Europa, mercados, FMI).

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