“Debaixo dos Arcos” foi, e ainda é, o primeiro blogue não virtual de Aveiro. Espaço de encontro, “tertúlia” espontânea, “diz-que-disse”, fofoquice pegada, críticas e louvores, ..., é uma zona nobre da cidade, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontram e conversam sobre "tudo e nada": o centro do mundo...

05 setembro 2008

Fim de Verão...

Publicado na edição de ontem (4.09.2008) do Diário de Aveiro.

Sais Minerais
Fim de Verão...


Aproxima-se o final de mais um verão. Um mais ou menos insípido, entre o bom e o sofrível, com uma alternância meteorológica que deixa saudades de outros tempos. Um final que nos remete para o regresso ao trabalho, à escola e à cidade. Uma cidade que merece um olhar…
Esta cidade que é nossa!
Como em quase tudo na vida, existe em nós portugueses uma facilidade única em transpor para os outros a responsabilidade que, em muitos casos, deveria ser, no mínimo, repartida.
Se é certo que, por “força” dos preceitos democráticos, elegemos (para o bem e para o mal) aqueles que entendemos como melhor preparados para a gestão da coisa e do bem públicos (local ou nacional), também não é menos verdade que é sempre mais cómoda a posição crítica (quase sempre destrutiva) do que o empenho comum.
É igualmente verdade que existem erros de gestão que são lamentáveis e penalizadores para o desenvolvimento das comunidades. Mas até quando a participação individual de cada cidadão, a sua quota parte de responsabilidade social pela causa comum e merecedora de distinção?!
Somos confrontados com a perda significativa da qualidade de vida nas cidades por força de diversos factores (mesmo que perfeitamente relacionados): o aumento de tráfego, a falta de estacionamento ou a escassez de espaços lúdicos, zonas onde, por exemplo, as crianças possam brincar ou aprender, em segurança, a andar de bicicleta.
Tendo consciência disso mesmo, a utilização dos transportes públicos é reduzida, os percursos pedonais ou de bicicleta, cumprindo distâncias mínimas, são considerados penosos. Em contrapartida, mesmo com o elevado custo dos combustíveis, preferimos o esforço financeiro familiar (já por si penoso) a prescindir do conforto do nosso automóvel. Mesmo sabendo dos impactos no ambiente, saúde pública, qualidade de vida urbana e saúde individual.
É incomparável a vida urbana de hoje da que se viva há uns 20-30 anos atrás. Brincava-se na rua, nos passeios, jogava-se à bola entre a passagem, mais que esporádica, de um carro, faziam-se, em segurança, as mais diversas actividades de bicicleta.
Hoje o Parque da Cidade não tem vida porque raramente as pessoas o utilizam (ficou sem barcos, sem macaca, sem corridas de jogging, sem futebol, sem…); a baixa de Sto. António não atrai e o Rossio, tirando a azáfama da noite, só por iniciativas esporádicas das entidades locais (Câmara e Junta de Freguesia, fundamentalmente) e do vai-vém dos moliceiros com os turistas, vai tendo brilho.
Aveiro está a transformar-se numa cidade cinzenta, sem movimento, sem pessoas que lhe dê cor e vida.
E a cidade é de e para as pessoas… de todos nós!
As Flores do Vouga.
Ele há coisas… e, para muitos, quase que “milagres”.
Ao fim de dez (longos) anos, as Florinhas do Vouga têm o espaço que dignamente merecem.
E merecem-no, por todo o trabalho que social e humanamente (acrescido da sua essência religiosa) desenvolveram e desenvolvem na cidade.
É esta missão social e politica que, em muitos momentos, vai falhando no papel da Igreja, nos dias de hoje.
É este saber estar na comunidade, intervir no seu desenvolvimento, ajudar aqueles que mais precisam e que, na maioria dos casos, o Estado não soube, não pôde ou não quis auxiliar.
É o saber estar nos momentos certos, nos locais e espaços que para muitos causam aversão e com aqueles que trazem a indiferença social e comunitária como companhia diária.
Finalmente…

Ao sabor da pena…

7 comentários:

Didas disse...

Concordo que Aveiro está a perder a vida. E tenho o meu diagnóstico pessoal feito. Mas que devido a condicionalismos vários, não devo tornar público.
Mas fico triste.

saltapocinhas disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
saltapocinhas disse...

eu não concordo inteiramente!

acho que se há coisas que se perderam (como as bribcadeiras na rua, mas isso é mal geral) há muita gente nas ruas, pelo menos durante o dia.
Já à noite...
tirando a praça do peixe (dizem) é uma pasmaceira, mesmo no verão.
Gosto de algumas cidades - principalmente interior e algarve - onde à noite anda tudo na rua, velhos, novos, bebés...
Por cá temos o condicionalismo do clima mas principalmente (e eu, ao contrário da didas, posso falar) a má politica das camaras - desta e das outras - que estão a deixar morrer a zona central das cidades.
Sei de uma pessoa que tem uma casa na nossa "zona histórica", que queria fazer lá obras para que lá pudessem ir morar filhas e netos e o processo está parado há anos!
pedem-lhe uma catrefada de documentos, ele vai tratar e, na volta, já não são aqueles, afinal eram outros...
Uma VERGONHA!!

ZÉ FAGOTE disse...

Como sempre uma boa prosa, Caro Miguel Araújo que inspira reflexões que nos levam a outros sentimentos...
Não tenha dúvidas meu Caro, os tempos mudaram radicalmente.
Dizem que são consequências do “crescimento” e da “evolução” das coisas no mundo.
Seja como for, os que conheceram o que era viver, não são felizes, e só o é, quem nunca teve a sorte de conhecer essa felicidade.
Os que já foram gente, sentem que hoje são números...
O próprio conceito de família já não é, e o que era, os mais novos, nunca chegarão a saber por vivência.
A própria igreja não se mexeu positivamente no sentido de procurar dar mais felicidade às pessoas, também ela foi absorvida por este turbilhão que arrasta tudo e todos, e que ninguém sabe onde vai parar.
As grandes alegrias, frustrações, e preocupações de ontem, hoje são olhadas como coisas fúteis, a que não se dá importância, desde que não dê prisão ou vergonha semelhante.
O bom-nome de alguém, não está na honestidade, está no bom carro que apresentam, fatos caros, e uma vida à grande.
Ninguém se preocupa em saber de onde vem o dinheiro.
Seja como for todos nós temos de nos adaptar à selva que fomos criando e nos ultrapassou sem darmos por ela, isto se quisermos sobreviver.
Gostei do texto.
Cumprimentos.

Migas (miguel araújo) disse...

Pois é Didas... também eu fico triste. Por Aveiro e pelos condicionalismos que também os tenho.

Migas (miguel araújo) disse...

Saltapocinhas...
Afinal acabámos por concordar quase que inteiramente.

Migas (miguel araújo) disse...

Caro Zé Fagote.
Obrigado pelas palavras.
Permita-me apenas um acrescento o um atreviento, quando diz "As grandes alegrias, frustrações, e preocupações de ontem, hoje são olhadas como coisas fúteis, a que não se dá importância, desde que não dê prisão ou vergonha semelhante".
É que, pelo andar da carruagem da nossa Justiça, já é muito difícil(aconteça o que acontecer, façam os incumpridores o que de mais errado houver, que Prisão é algo que o nosso Código Penal vai esquecendo.
Cumprimentos