“Debaixo dos Arcos” foi, e ainda é, o primeiro blogue não virtual de Aveiro. Espaço de encontro, “tertúlia” espontânea, “diz-que-disse”, fofoquice pegada, críticas e louvores, ..., é uma zona nobre da cidade, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontram e conversam sobre "tudo e nada": o centro do mundo...

18 fevereiro 2007

O Renascer Salgado

Publicado na edição do dia 15.02.07 do Diário de Aveiro.

Post-its e Retratos
Renascer.


Nos dias de hoje, face ao crescente e hegemónico poder da economia, a riqueza de uma região mede-se pela sua capacidade produtiva, financeira e pela sua capacidade de investimento. A isso, praticamente, se resume a capacidade de desenvolvimento de uma região.
Infelizmente…
Porque existem outros factores que, embora não sejam capazes de produzir directamente riqueza, são importantes para a sustentabilidade de uma região, para o “combate” à sua descaracterização.
A identidade histórica e cultural, as raízes etnográficas e o património regional (ou nacional) são a essência de um sentido comunitário e são igualmente um factor importante de riqueza.
Tal como referi no artigo anterior sobre a importância da Ria de Aveiro para o desenvolvimento e afirmação da região, existe outra realidade que faz parte dos anais da nossa cultura, história e economia de Aveiro: o Sal. Este é uma identidade há muito perdida e esquecida.
E foi com alguma satisfação que vi o esforço das entidades responsáveis por Aveiro, no sentido de revitalizar este nosso património que sustentou historicamente a formação da nossa região.
O sal foi, durante séculos, um produto e uma realidade social e cultural de enorme importância para o desenvolvimento económico e turístico de Aveiro. Quer na sua produção, quer na influência que exerceu em áreas paralelas como a salga do bacalhau e as indústrias químicas.
No século XVI, com a expansão do comércio marítimo, ao mesmo tempo que Lisboa se convertia num dos mais importantes portos mundiais, Aveiro tornava-se, por força dos carregamentos de sal para os navios, um dos mais importantes portos nacionais e uma região de referência.
Mesmo que dois séculos depois, por questões ambientais, a actividade da salinicultura e comercial de Aveiro tivesse ficado em risco, o esforço de todos os aveirenses pela necessidade da abertura da barra devolveu a expansão da região, da quala explosão demográfica da altura é um exemplo claro dessa realidade.
No entanto, volvidas as últimas duas décadas, Aveiro assistiu, passivamente, a um abandono da actividade e preservação das salinas. Factores económicos, ambientais, sociais, políticos contribuíram para o estado actual da perda desta nossa importante identidade regional e patrimonial.
A paisagem natural desapareceu, os “montes” brancos rarearam, as salinas ficaram abandonadas, desprotegidas e degradadas, o peso económico do sal na região deixou de ter relevância e de ter sustentabilidade.
Aveiro transformava-se, mas perdia uma realidade histórica e cultural importante.
As mais recentes gerações, olham para o sal sem terem com ele qualquer sentimento de identidade regional.
Aveiro, terra de pescadores, moliços, salineiras e marnotos, já só recorda e vive esta sua identidade em livros fechados, no bolor das bibliotecas, na memória perdidas dos “muito velhos”, nalgumas figuras das barricas de ovos moles ou nas ilustrações dos seus raros moliceiros.
Ou vive na esperança e no esforço daqueles que ainda guardam na sua identidade esta vontade extrema de ser aveirense.
É pois urgente a revitalização e dinamização desta actividade, da paisagem, cultura e história aveirense, da certificação do Sal e em renovar este rico património aveirense.
Registe-se o esforço da Rota da Luz, da Câmara Municipal, da recente Cooperativa dos Produtores de Sal, dos ainda existentes marnotos e daqueles que têm vontade em “abraçar” esta importante realidade de Aveiro.
É importante que o esforço seja de todos nós.
Que o sal salgue de novo esta região.

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